CIDADE | IPITANGA
01 SET 2014 | Um suposto erro nos registros cartoriais, há 40 anos, resultou na anexação fiscal a Lauro de Freitas do que é território de Salvador desde 1969. O loteamento Marisol, em Ipitanga, foi autorizado em março de 1974 por meio de Termo de Acordo e Compromisso (TAC) assinado por Ismael Ornelas Farias, prefeito de Lauro de Freitas, quando já não fazia parte do município. Inscritos no cadastro imobiliário de Lauro de Freitas, os lotes ainda hoje pagam IPTU ao município errado. A prefeitura de Salvador, que registra débitos relativos àquela mesma área de mais de R$ 9,5 milhões apenas desde 2010, avisou à reportagem da Vilas Magazine que está finalizando o plano para cadastramento dos moradores da região e que os registros dos imóveis deverão ser retificados. Para isso, de acordo com a prefeitura de Salvador, já foram realizadas duas audiências na sede do Ministério Público (MP) da Bahia.
> REPRODUÇÃO
> O TAC do Marisol, assinado em 1974 pelo prefeito de Lauro de Freitas: território anexado > © COPYRIGHT VILAS MAGAZINE
> Cristiano Robson em reunião com representantes das prefeituras: etapa inconclusiva
Existiriam hoje na área 1.046 imóveis, mas do cadastro imobiliário da capital ainda consta apenas um grande lote de 241,2 mil metros quadrados em nome de Arnaldo Rodrigues da Silveira, que deixou de ser o dono em 1972.
Os limites haviam sido alterados cinco anos antes, mas isso não impediu a prefeitura local de firmar Termo de Acordo e Compromisso (TAC) com Silveira, já então apenas procurador do proprietário. Washington Rydz Rebouças Santana seria, desde 1972, o dono da área, segundo registra o TAC do Marisol. O documento menciona registro do cartório do VI Ofício de Notas, de Salvador.
Tida como “área de litígio” entre Lauro de Freitas e Salvador, a maior parte de Ipitanga é, na verdade, território da capital há 45 anos. A rua Santo Antônio de Ipitanga, que margeia a cabeceira da pista do aeroporto internacional, marca o limite entre municípios e já tinha resultado claro quando da derrubada das barracas de praia, em 2011. Na prática, estão em questão todas as propriedades, condomínios inclusive, situadas a sul da rua Santo Antônio de Ipitanga.
Ministério Público – Desde sempre ignorada pela prefeitura de Salvador e administrada por Lauro de Freitas enquanto “área de litígio”, Ipitanga foi sendo ocupada, ao longo de décadas, mediante licenciamentos emitidos pela prefeitura local, que passava a cobrar o respectivo IPTU mesmo sem ter jurisdição administrativa ou fiscal sobre a área.
A questão veio à tona apenas em 2009, em conseqüência de reportagem publicada pela Vilas Magazine, em julho daquele ano, sobre as construções irregulares no leito do rio Sapato, na área do Marisol. Reportagem posterior mostrou os esforços da então prefeita Moema Gramacho (PT) para demolir parte das estruturas.
Na tentativa de remover todas as construções irregulares, a prefeitura de Lauro de Freitas recorreu ao Ministério Público, que abriu procedimento de inquérito civil. Em resposta, a prefeitura recebeu do MP, em novembro daquele ano, a lembrança de que a área não pertencia ao município e uma recomendação para que se abstivesse de conceder alvarás ou licenças ali “por falta de atribuição para tanto”.
Cristiano Robson, proprietário de um terreno no Marisol, tenta obter uma licença de construção que Lauro de Freitas já não fornece. “Devemos R$ 9,5 milhões à prefeitura de Salvador se quisermos regularizar”, constatou, preocupado, durante reunião dos moradores com representantes das duas prefeituras no mês passado.
De acordo com Marcos Cardim, outro dos proprietários, há ainda um problema adicional: um inquérito do MP poderá avaliar que “toda e qualquer construção na região é ilegal”, apesar de terem escritura e “habite-se” – emitido, claro, por Lauro de Freitas.
Esse inquérito tem raízes também na denúncia de cinco anos atrás: a Promotoria de Justiça de Lauro de Freitas tratou de encaminhar a questão à Promotoria de Meio Ambiente de Salvador, já que as denúncias estavam relacionadas ao território da capital. Desde então o Ministério Público atua apurando abusos ambientais cometidos na área.
Disputa territorial – Apesar de reconhecer que o loteamento não pertence a Lauro de Freitas, a prefeitura local seguiu cobrando IPTU porque os imóveis constavam do cadastro imobiliário do município. O erro de registro, em 1974, resultou numa esdrúxula situação: o município tem a obrigação de coletar o imposto ali, mas também não pode fazê-lo.
Por se tratar de território de Salvador, a prefeitura de Lauro de Freitas também nunca pode realizar investimentos no loteamento, ainda hoje sem calçamento, por exemplo. Nem máquinas de nivelamento das ruas podem ser enviadas pela prefeitura de Lauro de Freitas ao local, sob pena de descumprir normas legais. A rigor, nem coleta de lixo poderia haver ali, já que o serviço é pago pelos cofres públicos de Lauro de Freitas.
Por isso também, os poucos investimentos em infraestrutura anteriormente prometidos ao Marisol – embora não concretizados – tinham apenas a assinatura do governo estadual ou federal, nunca do município. Já a prefeitura de Salvador não presta serviços à região porque os lotes, oficialmente, não existem na capital.
Se para a capital é tudo uma questão de corrigir os registros dos imóveis e saldar a dívida de IPTU lançada, para a prefeitura de Lauro de Freitas a solução está nas mãos da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais do governo da Bahia (SEI). Uma comissão vem resolvendo há alguns anos as muitas questões de limites entre municípios da Bahia. A próxima região a ser tratada será justamente a Metropolitana de Salvador.
A prefeitura local já apresentou proposta de novos limites à SEI, incorporando a totalidade de Ipitanga e toda a faixa a leste da BA-526, a CIA-Aeroporto. Em contrapartida, Salvador ficaria com a região do Barro Duro, a norte da Via Parafuso.
A decisão, contudo, a menos que haja acordo prévio entre os municípios, seguirá os preceitos da Lei 12.057, de 2011, sobre a “atualização das divisas intermunicipais”. Como um deles prevê que “a redefinição dos polígonos e marcos divisórios entre os municípios terão como referência os limites administrativos ora praticados”, parece líquido e certo que Ipitanga voltará a ser integralmente território de Lauro de Freitas, incluindo o Marisol.
O prefeito Márcio Paiva (PP), de Lauro de Freitas, afirma que vem tentando reunir-se com o prefeito ACM Neto (DEM), de Salvador, na tentativa de alcançar um consenso e resolver mais rapidamente a questão. Já a disposição da prefeitura da capital em realizar o cadastramento imobiliário e corrigir os registros indica que não será tão simples retomar Ipitanga.
Santo Amaro de Ipitanga – A reconquista de Ipitanga remete ao processo histórico de emancipação de Santo Amaro de Ipitanga – o verdadeiro nome da cidade – que foi distrito de Salvador até 1962. Naquela época, o território de Lauro de Freitas incluía o Flamengo até a foz do riacho, na altura da rua Poeta Bráulio de Abreu, onde então começava Salvador.
A área total do município logo após a emancipação era de 210 km2 e abrangia ainda grande parte do que hoje é a região da Paralela, até Valéria. Incluía também o atual aeroporto internacional, que nasceu “aeródromo de Santo Amaro de Ipitanga” em meados do século passado.
Foi em 1969 que a Assembleia Legislativa da Bahia resolveu reduzir Lauro de Freitas aos atuais 57 Km2, recortando os novos limites da capital exatamente no muro da Base Aérea da Aeronáutica. Só depois disso o aeroporto passou a ser de Salvador. Com ele, foi-se a maior parte de Ipitanga – justamente a região que compõe o topônimo histórico de 406 anos da cidade.
Incerteza – Para os moradores do loteamento, a questão passa ao largo de questões históricas e legislativas: trata-se de acabar com a incerteza que se abateu sobre o patrimônio de mais de mil famílias. Os quase R$ 9,5 milhões da dívida de IPTU registrada em Salvador desde 2010 para toda a área, quando proporcionalmente distribuídos resultam em mais de R$ 96 mil para apenas um dos proprietários.
Diante do susto e sem informações sólidas, a comunidade convidou as duas prefeituras para uma reunião no mês passado. Salvador enviou André Fraga, secretário municipal da Cidade Sustentável, que informou não ter jurisdição sobre o assunto que estava sendo tratado e se prontificou a levar o problema a quem de direito. Já Márcio Paiva encarregou Eliana Marback de dar explicações. A secretária de Planejamento de Lauro de Freitas começou por historiar o erro de registro, reafirmando o interesse da prefeitura em retomar Ipitanga, mas foi definitiva: “o limite municipal é muito claro, existe”.
Sem que a reunião resultasse em qualquer nova medida por parte das prefeituras, os moradores resolveram formar uma comissão para conversar com a prefeitura de Salvador e acompanhar o inquérito originado daquela consulta da prefeitura de Lauro de Freitas em 2009.
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> A construção sobre o leito do rio Sapato que trouxe toda a questão à tona em 2009 > © COPYRIGHT VILAS MAGAZINE
> O Marisol abandonado: Lauro de Freitas não pode investir e ruas não existem para Salvador
Bom dia, Santo Amaro de Ipitanga
A edição de setembro da Vilas Magazine começa a circular no dia dois destacando em editorial a marca de 200 edições. Outro tema de destaque é o fim da coleta de lixo que a prefeitura sempre fez no pequeno comércio. O fim do serviço público está embasado em lei federal de 2010 que prevê responsabilidade compartilhada entre o poder público e o empresariado, deixando a regulamentação a cargo dos municípios. Em Lauro de Freitas, é uma lei de 22 anos atrás que estabelece o limite de 100 litros ou 500 kg para o que pode ser considerado “lixo domiciliar”. Qualquer coisa acima disso seria “responsabilidade do estabelecimento comercial”. Em Salvador, o limite é de 300 litros por dia.
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