
CIDADE | QUINGOMA
1 JUN 2015 | Moradores do Quingoma, em Lauro de Freitas, reivindicam a interrupção das obras da Via Metropolitana, que vai ligar a BA-526 (CIA-Aeroporto) à BA-099 (Estrada do Coco), na altura de Busca Vida, em Camaçari. A comunidade, reconhecida em 2013 como território quilombola pela Fundação Cultural Palmares, esteve no foco da audiência promovida pela Defensoria Pública de Lauro de Freitas na Câmara Municipal no mês passado.
> VIVIANE SALES
> Comunidade do Quingoma protesta contra traçado da Via Metropolitana na porta da Câmara
A nova via atravessa o território que a comunidade quer ver certificado como remanescente de Quilombo. A área ainda precisa passar por estudo antropológico antes de ser demarcada e oficializada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
Para as lideranças do Quingoma, a comunidade deve ser tratada como território remanescente de Quilombo desde já. Legalmente, mesmo assim a estrada poderia ser construída, mas a Concessionária Bahia Norte (CBN), que executa a obra, propôs o estabelecimento de diálogo.
O objetivo é convencer a comunidade a aceitar a visita dos técnicos contratados pela empresa, que vão cadastrar os imóveis passíveis de desapropriação para a construção da via. A comunidade se opõe à obra por considerar essencial a unidade do território.
O primeiro problema identificado na audiência é que o território que a comunidade quer preservar não está demarcado.
“Só se pode respeitar determinada área sabendo que área é essa, quais são os seus limites, que território é esse”, lembrou Francisco Ribeiro, da CBN. Conhecendo os limites, a CBN estaria disposta a “estudar alternativas de engenharia no sentido de contornar aquela área para evitar, se for possível, que a via passe naquele trecho e impacte diretamente a comunidade”, completou.
Rejane Rodrigues, uma das lideranças da comunidade, rejeita liminarmente qualquer hipótese de entendimento. “Não queremos sair de nossas terras, nossas casas, para ir para caixas de fósforos que estão para nos oferecer”, disse. “A gente não quer dinheiro não”, completou.
Para o defensor público Gilmar Bittencourt, promotor da audiência, o essencial é que a comunidade seja inserida no diálogo e sugeriu a formação de uma comissão com a participação do Legislativo municipal. Na exposição de motivos que levou à convocação da audiência, Bittencourt lembra que a obra vai atravessar o território em questão “sem que a comunidade tenha conhecimento ou tenha participado da elaboração do seu projeto”.
Uma única audiência pública prévia à obra teria sido realizada na Unime, fora da comunidade afetada e sem participação representativa dos moradores do Quingoma.
De acordo Leana Mattei, assessora de desenvolvimento socioambiental da CBN, depois de uma primeira tentativa de visita, mal sucedida, “o governo da Bahia ficou responsável por fazer essa ponte com a comunidade”, mas ele “não nos deu retorno”. Leana contou ainda que o governo do estado informou equivocadamente a existência de um acampamento do Movimento Sem Terra (MST) na região – e não de um território remanescente de Quilombo.
Projeto – Os primeiros estudos para implantação da Via Metropolitana foram apresentados pela CBN a autoridades em janeiro de 2014. O traçado, obtido com exclusividade pela Vilas Magazine na época, contorna a área urbana de Lauro de Freitas através do Quingoma, Parque São Paulo e Capelão. Está previsto para o futuro um segundo trecho de via rápida ligando a BA-526 à avenida Paralela, por fora do bairro de São Cristóvão.
São 11,2 Km de pista dupla, com duas faixas por sentido e canteiro central. Estão projetadas duas pontes, uma sobre o rio Paranamirim, ainda em Camaçari, com 20m de extensão e outra sobre o Joanes, no limite com Lauro de Freitas, com 80m. Haverá ainda viadutos sobre a Rua Direta do Capelão, na altura da Estrada do Quingoma e sobre a Rua do Casarão.
Outro viaduto, com 40 metros de extensão, cria novo acesso ao Jambeiro e ao Caji Caixa d’Água pela via Caji-Jambeiro, no prolongamento da avenida Gerino de Souza Filho. A área, que passa por acelerada ocupação, com a implantação de conjuntos habitacionais, deve multiplicar a velocidade de urbanização depois da abertura da nova via.
Na interligação da Estrada do Coco à nova via, logo após a entrada para Busca Vida, haverá mais dois viadutos de 90 metros cada e um novo retorno – que vai poupar alguns quilômetros diários no percurso de quem reside depois da entrada para Buraquinho.
Os moradores desse trecho da Estrada do Coco hoje são obrigados a seguir até Vila de Abrantes para então retornar, se quiserem transitar para o Centro de Lauro de Freitas ou Salvador. O problema é que o governo agora propõe a implantação de um pedágio no sentido Camaçari-Salvador que afetará os moradores de Abrantes.
O projeto inicial já previa o pedágio apenas no sentido Camaçari – Salvador, para quem vem da BA-099, mas a praça de cobrança seria localizada na Via Metropolitana, não na Estrada do Coco.
A Via Metropolitana havia sido prometida pelo governador Jaques Wagner (PT) como parte de um pacote destinado à mobilidade urbana na RMS, conforme publicou em primeira mão a Vilas Magazine em setembro de 2012. O projeto foi retomado pelo governador Rui Costa (PT) no princípio deste ano.